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Carol Rache

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“Nunca foi tão evidente a necessidade das pessoas de se rotular.”

Com que facilidade você discorda dos grupos nos quais está inserido?

Discordar dos grupos sociais dentro dos quais não nos sentimos acolhidos é, de certa forma, quase inevitável. A minha pergunta se refere, contudo, ao ato de discordar quando estamos cercados por pessoas que admiramos e com as quais nos identificamos.

A maioria vai responder que sim. Mas arrisco dizer que, na prática, a minoria consegue, de fato, sair do efeito manada.

Já percebeu como as multidões sempre elegem um arquétipo – seja humano ou mitológico – para ditar quais são as condutas corretas e quais são as condenáveis? É muito mais simples seguir um manual de instruções e se sentir seguro e puro ao “obedecer” às regras sugeridas do que ter o trabalho de se observar com honestidade para conhecer as próprias verdades. E esta é uma das razões pelas quais o mundo está cada vez mais polarizado e as pessoas cada vez mais enquadradas.

Mesmo os ativistas que se propõem a ir contra os estabelecidos enquadramentos sociais e às heranças culturais acabam esbarrando na tentação de se reenquadrar em uma nova ideologia e, dessa forma, continuam se sentindo constrangidos quando alguma convicção do grupo não corresponde aos seus juízos pessoais. E, nesse contexto, muitos têm dificuldade de discordar porque temem que deixarão de ser incluídos.

Nunca foi tão evidente a necessidade das pessoas de se rotular. Precisamos ter nome para tudo. Como você vive a espiritualidade precisa ser resumido em uma palavra. Como você se alimenta precisa ser definido por um protocolo. Como você enxerga o mundo precisa ser determinado em uma polaridade.

Tenho extrema dificuldade de explicar minha religião porque não consigo fazer minha fé caber em apenas uma. Eu me sinto confusa quando me perguntam se sou vegana ou vegetariana porque não consigo explicar de forma clara que de segunda a quinta minha alimentação é vegana, de sexta a domingo, vegetariana, mas que de vez em quando eu como peixe e kibe cru. E fico perdida por não concordar com o machismo, mas achar que o feminismo é a mesma distorção na polaridade oposta.

É como se, para preferir comidas veganas, eu precisasse me submeter a todas as convicções de quem carrega esse rótulo. Ou como se eu não pudesse crer em Deus e em Cristo sem escolher uma religião ou um “guru”. E, indo mais fundo, como se eu não tivesse direito de discordar do machismo e, ao mesmo tempo, questionar os extremismos incoerentes do feminismo. No fundo, é como se eu não pudesse ser eu! Socorro!

É preciso ter clareza de que, quando nos vestimos de alguma bandeira acreditando que estamos rompendo com o sistema, mas não nos permitimos discordar dos grupos nos quais estamos inseridos – sejam eles quais forem –, estamos apenas trocando um tipo de enquadramento por outro. E, assim, continuaremos vivendo sem liberdade, sem autenticidade e sem conhecer a nossa íntima verdade.

Ninguém quer ser rotulado pelos outros, mas a maioria se cobre de bandeiras que trazem consigo manuais de instruções predefinidos e, sem perceber, se rouba o direito legítimo de pensar com a própria cabeça e discordar.

Nossa liberdade termina quando somos tão seduzidos pela necessidade de fazermos sentido para os outros que deixamos de fazer sentido para nós mesmos.